domingo, 30 de junho de 2013

O mau jornalismo, o estilista famoso e o asilo político


Todo mundo que reclama, com inteira razão, do nível do jornalismo brasileiro, não deve apenas bater nos pobres coitados que trabalham nas redações. Como em qualquer lugar, há bons e maus profissionais, gente com e sem caráter, embora a mediocridade seja a regra geral: são poucos os que se arriscam a sair do lugar comum, da rotina do dia a dia, da cobertura de entrevistas coletivas burocráticas, da pauta sem criatividade, de um fastio generalizado que se intensificou com a decisão do patronato de demitir grande parte da força de trabalho.
A verdade é que só neste ano, fazendo uma conta rápida de cabeça, dá para dizer que mais de 100 jornalistas foram mandados embora das principais redações paulistanas: Folha, Estadão, Abril, Valor.

É muita gente, principalmente se for levado em conta que os cortes estavam sendo feitos havia algum tempo, mais discretamente.
A conclusão óbvia é que o patronato pensa em manter a mesma rentabilidade - ou até aumentá-la - com um quadro de funcionários menor, ou seja, pretende que os profissionais sejam mais produtivos, ou, simplesmente, trabalhem mais para suprir a falta dos demitidos.
O resultado é essa tragédia exposta nas páginas dos jornalões, das revistas, dos portais de notícias, nas rádios e televisões.
Erros para todos os gostos: gramaticais, aos montes, e de informação, à vontade. 
Sem contar com frases mal construídas, sem sentido ou de sentido dúbio, sem lógica nenhuma, títulos que contrariam a notícia, ausência absoluta do que distingue um jornalista de uma ave palradora: o repórter tem por obrigação saber sobre o quê o entrevistado está falando, conhecer o assunto que está cobrindo, pelo menos de modo a não publicar bobagens antológicas, dados falsos, esse tipo de coisa que está virando rotina.
Repetir literalmente as declarações de uma pessoa não é um trabalho jornalístico, isso é o que faz um papagaio. O gravador, até mesmo esses modernos, digitais, não pode, nunca, substituir o bom senso: ora, se o entrevistado falou uma asneira, o repórter tem por obrigação alertá-lo sobre isso, para que a informação, o núcleo do seu trabalho, esteja correto.
O erro que o fulano cometeu, a sua gafe, pode até constar da notícia, mas nunca ser a notícia: muitas vezes o engano é inconsciente, por motivos vários; em outras ele é deliberado - há muito espertalhão por aí que usa e abusa da ingenuidade e falta de preparo dos repórteres para soltar o que se chama da gíria jornalística de "balão de ensaio", uma informação que serve só para quem a deu medir a sua repercussão.
Hoje estava lá, no site da Folha, um título-chamada para a revista Serafina, que resume bem a indigência técnica, intelectual - moral, até - da nossa imprensa: "Alexandre Herchcovitch pensa em pedir asilo político em outro país." 
Na matéria não existe nenhuma frase que corrobore essa intenção absurda. Asilo político a pessoa pede quando se acha perseguida politicamente em seu país, com risco de ser preso, quando não tem mais garantia nenhuma de que poderá continuar a levar a sua vida normal, exercer a sua profissão etc e tal.
Para sair do Brasil, o estilista em questão não precisa pedir asilo político para nenhuma nação: basta ele comprar, pela companhia aérea de sua preferência, na classe que quiser, a sua passagem de ida e viajar para onde bem entender. 
O Brasil ainda é um país livre, embora muitos estejam fazendo de tudo para que essa, a maior virtude de uma democracia, seja jogada no lixo da história.
Quem fez o tal título ou deve ser um ignorante ou então um mau caráter. 
O duro é a gente perceber que as duas categorias, infelizmente, estão em alta no Brasil atual.

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